Dia 2 de abril – Dia Mundial de Conscientização do Autismo

Autismo: Respeito para todo o espectro.

O texto a seguir foi baseado em uma história real e tem como objetivo trazer uma reflexão sobre o que significa a palavra espectro e as dificuldades nela embutidas e a urgência que toda a sociedade tem de respeitar as diferenças, mesmo quando elas não são tão óbvias.

 

Uma história de Sofia…

Autora: Lívia Aureliano (Psicóloga. Doutora em Análise do Comportamento. Diretora do TatuTEA Espaço de Intervenção Comportamental

Era uma vez Sofia (nome fictício), uma garota de 19 anos que procurou ajuda de um psicólogo depois de muitos anos de sofrimento. Sofia havia sido diagnosticada com Depressão, Transtorno Obsessivo Compulsivo e Ansiedade e foi devidamente medicada. Quando procurou terapia, Sofia contou que desde muito pequena se sentia diferente de outras crianças: não gostava das mesmas coisas, se sentia perdida no meio de muita gente. Sentia uma espécie de angústia quando chegava na escola, a ponto de precisar ir ao banheiro para se acalmar e “enfrentar” a sala de aula. Muitas vezes não conseguia ir à escola e ficava chorando muito em casa, pois sabia que tinha que ir, pois aquilo não era normal.

Sofia queria muito fazer uma faculdade, mas sabia que não seria fácil. Tinha um medo muito grande do julgamento dos outros, pois afinal, o que essa menina tem? Ela mesma não sabia dizer nem explicar. Sofia tinha uma grande habilidade com desenhos. Passava horas em casa desenhando, mas não tinha coragem de mostrar para ninguém. Durante a terapia, Sofia levava seus desenhos e contava o que havia a motivado para desenhar aquelas figuras. Eram muito bonitas, porém Sofia não tinha coragem de postá-las em redes sociais. “E se as pessoas não gostarem? Não tenho coragem de submeter as pessoas a coisas que elas não gostam”.

Depois de alguns meses de terapia, Sofia prestou vestibular e ingressou em um curso que tinha tudo a ver com suas habilidades. Depois disso, o processo terapêutico foi interrompido.

Após alguns anos, porém, Sofia buscou novamente o mesmo profissional. A impressão do psicólogo foi que se tratava de uma outra pessoa: mais comunicativa, mais expressiva, mais motivada. No entanto, ainda com muito sofrimento. Sofia contou como havia sido sua experiência na faculdade. Todas as dificuldades e todas as suas conquistas. Contou como foi difícil e, ao mesmo tempo, desafiador, fazer o estágio obrigatório. E naquele momento, sentia-se novamente muito ansiosa, às vezes depressiva, e queria muito encontrar um emprego.

Sofia voltou ao psiquiatra e voltou a tomar as medicações. Sentiu-se melhor. Porém, faltava alguma coisa. Nessa ocasião, o psicólogo começou a desconfiar. E nesse mesmo momento, Sofia, sem muita delonga, perguntou diretamente: você acha que eu sou autista? O psicólogo, em vez de responder diretamente, perguntou se ela achava que era e por quê. Sofia começou a relatar diversas histórias de sua infância e até mesmo histórias recentes que, aliadas às informações que ela começou a buscar depois de ter assistido um vídeo no YouTube, fizeram-na desconfiar de que ela era autista. Após o psicólogo ter ouvido a tudo o que Sofia havia contado, somadas às observações que ele mesmo havia feito a partir do prontuário e da última sessão, ele respondeu à Sofia que sim, que achava que ela era autista.

Eu pergunto a vocês: o que acham que aconteceu após isso? Sofia entrou num sofrimento imenso após se dar conta de sua condição? Ou ficou aliviada por conseguir, finalmente, começar a entender o que realmente acontecia com ela durante toda a sua vida? Pois é, a segunda alternativa! Sofia começou a montar o grande quebra-cabeça da sua vida e as peças, agora, se encaixavam. Suas dificuldades começaram a fazer sentido: não gostar de ambientes barulhentos e com muita “informação”; sentir-se muito ansiosa no cinema, enquanto suas amigas curtiam o filme, afinal, aquele som e luz a faziam se sentir angustiada e perdida. Começou a entender que sua fotossensibilidade não era um problema oftalmológico. Que sua sensação de “flutuar” ao chegar em ambientes tumultuados tinha uma explicação e não se tratava de uma frescura, de apenas uma fuga de uma situação difícil.

No entanto, Sofia ainda está num processo de aceitação. Afinal, será que esse diagnóstico não é mais uma tentativa de justificar sua “esquisitice”? Será que não é uma grande frescura? Esses são questionamentos que ela se faz. E por que eu quis contar essa história? Acredito que vocês tenham adivinhado que esse psicólogo, na verdade, sou eu. E por que eu não consegui identificar tudo isso anos atrás? A explicação é simples: porque na época eu não conhecia sobre autismo. Meus estudos sobre o tema começaram um tempo depois. Outros profissionais por quem ela havia passado ao longo de sua vida também não identificaram ou desconfiaram de algo. E seus pais? Também não… Sofia contou sobre essa hipótese diagnóstica a eles. E qual foi a reação? “Não, não faz sentido, você não parece autista. Você só é tímida.

E que conclusão eu tiro de tudo isso? Eu concluo duas coisas: a primeira é sobre a dificuldade do diagnóstico no caso de crianças e jovens que não apresentam os sinais “típicos” do autismo, como ausência de contato visual, estereotipias, atraso na aquisição da linguagem. Isso mostra o quanto a ideia do espectro faz sentido. Que cada pessoa com TEA é uma pessoa COMPLETAMENTE DIFERENTE da outra. Que não está “na cara” de ninguém o seu diagnóstico. Que aquela pessoa com quem você convive há anos, que tem alguns comportamentos “esquisitos”, que se sente mal em algumas situações que, para você, são normais, ou que tem dificuldade na interação social, na verdade, pode ser alguém com TEA e que talvez nem saiba. E isso me faz ter a segunda conclusão: o quanto o nosso conceito de “normalidade” é equivocado e quanto pode trazer sofrimento para quem não é considerado “normal”. Sofia é um ótimo exemplo. O maior sofrimento da vida dela foi, e continua sendo, não se sentir “normal”. Sentir que é julgada por suas características e comportamentos e se forçar, todo o tempo, a se encaixar no que os outros consideram normal. É não conseguir se sentir RESPEITADA pelo o que ela é, por suas habilidades, pelas suas potencialidades. Passar uma vida tentando ser o que não é, para que os outros não fossem obrigados a conviver com alguém diferente, é muito sofrimento.

Torço para que essa história promova algum tipo de reflexão aos leitores e que ajudem a cada um de nós finalmente entendermos que o TEA é um grande espectro, que assim como nós, supostos neurotípicos, que não somos iguais uns aos outros, as pessoas com TEA também não são todas iguais e que merecem, acima de tudo, RESPEITO!! #RESPECTRO

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Espaço Especializado em ABA

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