Tratamento ABA está ou não contemplado no rol da ANS?

PARECER JURÍDICO TAXATIVIDADE DO ROL DA ANS
EREsp n.º 1886929/SP e REsp n.º 1889704/SP

Requerente: TatuTEA Espaço de Intervenção Comportamental Ltda.

Relatório:

A Requerente, após o julgamento pelo STJ do REsp n.º 1889704/SP e do EREsp n.º 1886929/SP no dia 08/06/2022, solicitou parecer jurídico com análise do rol taxativo da ANS e a aplicação do tratamento ABA, considerando a repercussão e importância do tema para o TEA. Contudo, destacando que até a presente data os acórdãos não foram publicados, o que dificulta a elaboração do parecer, bem como que não é possível ter acesso ao fundamento de cada voto dos Ministros.

Destacamos que acórdãos com votos extremamente longos, bem como devida a relevância do assunto demoram de 3 a 4 meses para serem elaborados. Desta forma, assim que os acórdãos forem publicados avisaremos.

Síntese:

Nesse parecer, abordaremos os principais pontos do julgamento finalizado no início de junho deste ano, onde a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser taxativo, em regra, o rol de procedimentos e eventos estabelecido pela Agência Nacional de Saúde (ANS), não estando as operadoras de saúde obrigadas a cobrirem tratamentos não previstos na lista.

Ressalta-se, contudo, que o colegiado fixou parâmetros para que, em situações excepcionais, os planos custeiem procedimentos não previstos na lista, a exemplo de terapias com recomendação médica, sem substituto terapêutico no
rol, e que tenham comprovação de órgãos técnicos e aprovação de instituições que regulam o setor.
Prevaleceu na sessão a posição do relator, ministro Luis Felipe Salomão, que incorporou em seu voto acréscimos trazidos pelo ministro Villas Bôas Cueva. Também votaram com o relator os ministros Raul Araújo, Isabel Gallotti, Marco Buzzi e Marco Aurélio Bellizze.

Ficaram vencidos no julgamento a ministra Nancy Andrighi, e os ministros Paulo de Tarso Sanseverino e Moura Ribeiro, para os quais o rol da ANS teria caráter meramente exemplificativo.

A grande vitória nesse julgamento ocorreu no EREsp 1.889.704, pois o STJ entendeu que a operadora deve cobrir tratamento para uma pessoa com transtorno do espectro autista, na medida em que a ANS já reconhecia a terapia ABA como contemplada nas sessões de psicoterapia do rol de saúde suplementar.

A decisão foi no sentido de que o Método ABA é uma das terapias possíveis ao tratamento não medicamentoso do autismo, não tendo sido excluído pela CONITEC. Por outro lado, a ANS considera que “as psicoterapias no método ABA estão contempladas na sessão de psicoterapia” do Rol da Saúde Suplementar (Relatório de Revisão do Rol 2018, pág. 147; e Nota Técnica nº 196/2017, pág. 146).

Registre-se que a decisão motivou a ANS a ampliar as regras de cobertura para os casos de transtornos globais do desenvolvimento, como, por exemplo, do espectro autista. A decisão foi tomada na em reunião da Diretoria Colegiada da agência (Resolução normativa ANS n.º 539, de 23 de junho de 2022).

Portanto, a partir de 1º de julho de 2022, torna-se obrigatória a cobertura para qualquer método ou técnica indicado pelo médico para o tratamento do paciente que tenha um dos transtornos globais do desenvolvimento.

Fundamentação:

No julgamento do EREsp n.º 1886929/SP, que tratou da taxatividade do Rol da ANS, o Ministro Villas Boas Cueva em seu voto explicou existe uma análise para a elaboração do Rol da ANS, que esta análise é minuciosa, desta forma o Rol estaria sempre atualizado, de 6 em 6 meses e podendo ocorrer analises antes deste prazo caso o tema seja urgente, e assim o entendimento dele é que o Rol é taxativo.

Ainda, chamou atenção para o impacto financeiro que o plano de saúde pode sofrer se o rol for exemplificativo, já que é feita uma análise dos valores dos tratamentos cobertos e desta forma chega-se no valor da mensalidade.

Cueva destacou a Lei n.º 14.307/2022 que aborda novos prazos para a atualização do rol de procedimentos da ANS, bem como a criação de uma comissão para análise de novos procedimentos e outros pontos, ou seja, mais um ponto que demonstra que o Rol da ANS está sempre atualizado e acompanhando as novidades científicas na área da saúde.

Desta forma, trouxe o entendimento que o Rol é sim taxativo, conforme transcrição do voto abaixo:

1 – o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo;
2 – a operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do Rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao Rol;
3 – é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra Rol;
4 – não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do Rol da ANS pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao Rol da Saúde Suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como CONITEC e NATJUS) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS.

Ainda, o Ministro Cueva, ressaltou que outras terapias como equoterapia e hidroterapia por não estarem no rol da ANS os planos de saúde não tem obrigatoriedade de cobrir, mas destacou que se houver pesquisas cientificas e fundamentos que demonstrem a eficácia da terapia, o plano deverá sim cumprir.

No caso concreto do julgamento o voto do Ministro Villas Boas Cueva foi no sentido de que o paciente que tem esquizofrenia paranoide e depressão severa, sendo que os tratamentos medicamentosos não surtiram efeito, razão pela qual foram indicadas sessões de estimulação magnética intracraniana, não incluída no Rol da ANS.

Contudo, o tratamento indicado já é mundialmente reconhecido, tendo em vista a sua eficácia e melhora dos pacientes após o tratamento, assim, mesmo que o Rol seja taxativo, o caso em concreto se encaixa nas excludentes, devendo sim o plano de saúde dar cobertura ao tratamento prescrito pelo médico do paciente.

A Ministra Nancy Andri também se manifestou no julgamento e destacou os problemas que a taxatividade do Rol trará para a vida de pessoas que necessitam de terapias não listadas no Rol da ANS. Todavia, seu voto foi vencido.

O entendimento da Ministra Nancy é que a natureza do Rol da ANS, não deve ser analisada sob o prisma de doença específica, caso contrário permitirá o cometimento de mais injustiças como as que sofreram até recentemente os muitos beneficiários portadores do espectro autista, que tiveram a respectiva cobertura negada, sob o fundamento de ausência de previsão no Rol.

Ainda, a natureza exemplificativa do Rol da ANS não leva a obrigatoriedade de todo e qualquer tratamento prescrito, a par das hipóteses legais de exceção, a obrigatoriedade de procedimento ou medicamento, deve ser sempre verificada caso a caso que será reconhecida, quando demonstrada a efetiva necessidade e a imprescindibilidade de um tratamento, a partir da indicação feita por um profissional habilitado, sem prejuízo da operadora realizar prova em sentido contrário.
Assim, a prescrição do médico que acompanha o paciente, faz presumir a demonstração técnica da efetiva necessidade do tratamento, presunção essa que se admite prova em contrário, cujo ônus deve recair sobre a operadora e não sobre o beneficiário.

Ora, o tratamento pode ser negado se não houver a comprovação de sua necessidade para determinado beneficiário. Daí se pode inferir também que o poder judiciário não decide sobre qual é o tratamento ou qual é o método, os quais são matérias técnicas afetas aos profissionais de saúde habilitados, decide, portanto, sobre a obrigação ou não de cobertura do plano de saúde, ou seja, questão essa exclusivamente de direito, diante de prova constitutiva do direito do beneficiário acerca da necessidade do tratamento pretendido.

No voto, a Ministra Nancy destacou o seu entendimento contra a taxatividade do Rol e os diversos problemas que os beneficiários poderão enfrentar para ter o tratamento necessário prescrito pelo médico que assiste o paciente.
Ainda trouxe em seu voto que a ANS não examina, não diagnostica, não prescreve ou acompanham o paciente, como faz o médico assistente. O NATJUS, assim como a ANS, não se responsabiliza perante o paciente pelo mau uso de determinado procedimento ou pela má indicação de certo tratamento.

Logo, a prescrição por quem irá se responsabilizar perante o beneficiário pelo tratamento realizado ganha especial importância na valoração das provas. Contudo, não pode negar que as manifestações do NATJUS, como da ANS, são válidas para orientar o juízo e municiá-lo com informações técnicas que podem ser consideradas na formação da sua livre convicção.

Por fim, a Ministra em seu voto destacou que seu entendimento é que o Rol da ANS deve sim ser exemplificativo e não taxativo.
Assim, após a manifestação dos demais membros da corte, a sessão de julgamento foi encerrada, decretando a taxatividade do Rol da ANS por maioria dos votos. No julgamento em que ocorreu a análise especificamente sobre o tratamento ABA (REsp n.º 1889704/SP) também foi destacado que o rol da ANS é taxativo, trazendo as exclusões que afastam a taxatividade, já citados acima.

O entendimento do Ministro Luís Felipe Salomão foi no sentido de que o julgamento teria perdido o objeto, tendo em vista que no próprio site da ANS já consta que o método ABA já está no rol da ANS, assim, não há que se questionar se o paciente tem direito do tratamento, já que o entendimento é pacificado a não limitação de sessões.

Ainda, o Ministro Salomão destacou que não há mais limitação para terapia ocupacional e fonoaudiologia, tendo em vista a recente decisão da própria ANS que confirmou às sessões ilimitadas de fisioterapia e incluiu a terapia ocupacional e a fonoaudiologia nesse rol. Para o Ministro, o próprio tratamento pelo método ABA pode ser utilizado pelo plano de saúde, desde que sua rede credenciada tenha profissionais, psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas que saibam este método (ABA).

A Ministra Nancy Andri levantou a questão se a eficácia da nova Normativa da ANS ocorrerá de forma retroativa, ou seja, ela será aplicada para casos que já foram julgados anteriormente, contudo, como esta questão não estava no pedido do processo julgado, não haveria por que decidir a questão no julgamento em comento.
Já a Ministra Gallott ressaltou que a questão era a limitação da terapia ocupacional e fonoaudiologia, sendo que na data da propositura da ação havia limitação, razão pela qual suscitou se o plano de saúde deveria reembolsar o valor pago desde a liminar.

Outro ponto levantado no voto da Ministra é se o plano de saúde, que tem terapeuta ocupacional, psicólogo, fonoaudiólogo sem ser especializado no tratamento ABA, terá que arcar com a terapia fora da rede credenciada por não ter profissionais credenciados para aplicação do método ABA, tendo em vista que o Rol da ANS não prevê método, este só prevê fonoaudiólogo, terapeutas ocupacionais e psicólogos.

Assim, a decisão foi no sentido de que o Método ABA é uma das terapias possíveis ao tratamento não medicamentoso do autismo, não tendo sido excluído pela CONITEC. Por outro lado, a ANS considera que “as psicoterapias no método ABA estão contempladas na sessão de psicoterapia” do Rol da Saúde Suplementar (Relatório de Revisão do Rol 2018, pág. 147; e Nota Técnica nº 196/2017, pág. 146).

Ressaltou, ainda, que a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007, da Organização das Nações Unidas (ONU), incorporada no Ordenamento Jurídico pátrio pelo Decreto nº 6.949/2009, e que detém estatura constitucional, assegurando, em seu art. 25, que “as pessoas com deficiência têm o direito de gozar do estado de saúde mais elevado possível, sem discriminação baseada na deficiência”, sendo vedada a “discriminação contra pessoas com deficiência na provisão de seguro de saúde e seguro de vida, caso
tais seguros sejam permitidos pela legislação nacional, os quais deverão ser providos de maneira razoável e justa” (art. 25, “e”).

Conclui-se, portanto, que a Segunda Seção do STJ entendeu, no EREsp 1.886.929, que o plano de saúde é obrigado a custear tratamento não contido no rol para um paciente com diagnóstico de esquizofrenia, e, no EREsp 1.889.704, que a operadora deve cobrir tratamento para uma pessoa com transtorno do espectro autista, porque a ANS já reconhecia a terapia ABA como contemplada nas sessões de psicoterapia do rol de saúde suplementar.

Importante destacar, ainda, que o julgamento do SJT sem dúvida movimentou a diretoria da ANS para que realizasse uma reunião extraordinária a fim de analisar a necessidade de que o tratamento com fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas é sim de suma importância para pessoas com transtornos globais de desenvolvimentos.

Logo, a Agência Nacional de Saúde ampliou as regras de cobertura para os casos de transtornos globais do desenvolvimento, como, por exemplo, do espectro autista. A decisão foi tomada na em reunião da Diretoria Colegiada da agência (Resolução normativa ANS n.º 539, de 23 de junho de 2022).

Com a determinação, a partir de 1º de julho de 2022, torna-se obrigatória a cobertura para qualquer método ou técnica indicado pelo médico para o tratamento do paciente que tenha um dos transtornos globais do desenvolvimento.

A normativa ainda ajustou o Anexo II do Rol para que as sessões ilimitadas com fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas englobem todos os transtornos globais de desenvolvimentos.

Por fim, a partir de agora, o cerne da questão será: as clínicas credenciadas no plano de saúde estão ou não aptas e capacitadas com profissionais com conhecimento do tratamento e do método específico para
realizar as terapias? E a agenda para realizar o tratamento na quantidade de horas prescritas pelo médico?

Conclusão:

Diante do exposto, entende-se que por mais que o rol da ANS seja taxativo e não mais exemplificativo, para o espectro autista foi um julgamento favorável, pois além de o plano de saúde não poder limitar as sessões, também deve cobrir as sessões de fonoaudiologia, psicólogo, terapia ocupacional e fisioterapia, independentemente do método a ser utilizado.

Além do que, a partir de 1º de julho de 2022, passa a ser obrigatória a cobertura para qualquer método ou técnica indicado pelo médico assistente para o tratamento do paciente que tenha um dos transtornos enquadrados na CID F84, conforme a Classificação Internacional de Doenças, motivo pelo qual este parecer mostra-se favorável.

É o parecer.

São Paulo, 19 de julho de 2022.

Danilo Mauricio Suyama – OAB/SP 345.242

Pamela Misawa Washington – OAB/SP 378.266

Caso necessário, os contatos da Dra. Pamela e Dr. Danilo estão disponíveis no site: www.ms2advogados.com.br

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